São 4h30 da manhã e a maior parte da população ainda dorme quando Nelson Silvério dos Santos fecha o pequeno portão de seu barraco. Ele confere se o cadeado está bem trancado. Não que muitos bens possam ser roubados. Lá dentro ficaram uma geladeira que tem 12 anos de idade, uma TV com o seletor quebrado, um sofá com molas à mostra e uma mesa na cozinha. Seu Nelson é pedreiro. Levará pelo menos duas horas e meia para chegar à obra onde trabalha, em Ipanema. A favela onde ele mora traz, no nome, um resumo do que será seu dia. Um resumo do que tem sido a sua vida. Vila Paciência.
Até chegar a estação do trem são 40 minutos de caminhada. Ele não pode pegar um ônibus. “Ou é a passagem ou é o café”, conforma-se. A estação está lotada. e, quando as portas da composição se abrem, Seu Nelson fica só olhando. Já foi empurrado, caiu nos trilhos, ficou com medo de morrer. Desistiu de disputar seu lugar no trem. Desistiu também de disputar outros lugares. Está conformado. Ele segue a viagem, pendurado onde dá. Está acostumado a viver assim. Equilibrando-se. Pendurado.
O trem está tão lotado que é impossível fazer uma boa foto. Depois, percebo que a única que consegui ficou assim, meio borrada. O que ela mostra, porém, é muito nítido. Pergunto se Seu Nelson sabe sobre o escândalo dos jatinhos de Brasília. Ele não consegue entender. “Mas eles são amigos, né? Ou deve favor ao outro?”. Respondo que eles dizem que não. “Mas como é que emprestam avião assim, do nada?”. Ele não entende.
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